Por Marco Leite
Pois em minha infância em Uruguaiana, durante muito tempo, fui “chibeiro”. Não daquele tipo tradicional, que trazia as coisas a cavalo ou puxadas por chalana. A história do chibo, esse “cabrito”, em castelhano, confundesse com o gaúcho da fronteira, principalmente de Uruguaiana. O chibo foi muito usado no contrabando do charque, e um dos motivadores das Guerras dos Farrapos e do Paraguai. Mas não é da história do Rio Grande do Sul que eu estou aqui para falar e sim de minha infância e das estripolias que eu e meus amigos fazíamos nas barrancas do Uruguai, lá pelos anos 70, tempo em que o Brasil foi tricampeão mundial. O nosso chibo era diferenciado e tinha um espírito aventureiro de fazer inveja a muitos chibeiros experimentados. Criei-me tendo uma família de chibeiros como vizinhos, todos filhos de um correntino com uma uruguaianense. Não lembro os nomes deles mas os apelidos sim, eram Balalo, Rengo e Chucha. Esses três, junto com o Bira, meu irmão mais velho e eu formávamos a quadrilha de chibeiros das barrancas do Uruguai. Lembro como se fosse hoje, quando alguém da casa vizinha gritava: “o fulano trouxe um chibo de Libres”, e nós nos reuníamos e nos preparávamos. O chibo passado por nós era bem interessante. Nos dirigíamos ao rio Uruguai, munidos de corda, câmeras de pneus de caminhões e muita coragem para enfrentar as correntezas do rio perigoso e que assustava mesmo. Mas nós, excelentes nadadores, não nos assustávamos com nada e era a mais pura diversão e aventura. Os chibeiros vizinhos passavam a mercadoria pela aduana Argentina, onde a fiscalização era mais “amiga”, e não conseguiam passar ao lado do Brasil. Então, a solução era se “livrar” do chibo no meio da ponte internacional e é ai que nós entrávamos. Ficávamos esperando de baixo da ponte e, por meio de cordas, recebíamos as mercadorias. Amarrávamos tudo nas “bóias”, devidamente envoltos em sacos plásticos para não molhar. Depois era “braciar” até a margem do lado brasileiro e comemorar mais uma aventura perigosa vencida. O “chibo” passado por nós era somente de produtos alimentícios: farinha, óleo, feijão, arroz, entre outras coisas. Garantíamos o sustento daquela família necessitada e que vivia essencialmente desse tipo de atividade. Naquela época quase não haviam roubos e assaltos em Uruguaiana, e o maior crime era exatamente este passar mercadorias e driblar a fiscalização com o “chibo”. Não sei como é que funciona hoje, pois estou distante. Mas se a evolução do ilícito chegou por essas bandas o “chibo” passou ser tráfico de drogas que, em nossa época, já existia com o “lança”, como era chamado um aérosol altamente intoxicante, muito usado nas festas de Carnaval tanto em Uruguaiana, como nas praias e na capital do RS.
Artigo Jornal A Tribuna - Uruguaiana - RS