sexta-feira, 29 de maio de 2009
Amigos que perdemos
pelo caminho...
por Marco Leite
... em minha vida desregrada e no mundo das drogas as coisas não foram totalmente inaproveitáveis. Durante esse período de fugas encontrei também grandes amigos, pessoas boas e que, como eu, se perderam em algum momento de suas vidas.
O uso das drogas e álcool começa como uma brincadeira, alguns usam por um tempo e abandonam, outros passam a vida inteira usando com moderação em festas, fins de semana e ocasionalmente. Mas, como eu, muitas pessoas desenvolveram a dependência e não conseguiram recuperação ou ajuda de alguma entidade, tipo a que me foi oferecida pela Comunidade Terapêutica Fazenda Renascer.
Durante o período de minha drogadição ativa e em minha recuperação perdi muitos amigos especiais e digo especiais mesmo. O primeiro deles morreu muito jovem aos 19 anos e era quase que um irmão mais novo, o ano foi 1989. Naquele tempo eu ainda não usava drogas e era um bebedor de fins de semana, mas estava sempre com esse menino e o protegia. Foi um garoto que ensinei a profissão de diagramador, mas ele, talentoso, logo já estava superando o mestre. Foi meu colega de serviço durante anos, mas foi tirado de minha vida de uma maneira chocante, foi a primeira grande perda de um amigo que tive. Volta e meia lembramos dele em nossas rodas de conversas, era um menino sem maldade e uma alma pura, mas que foi derrotado pela dependência.
Passaram-se os anos e fui perdendo vários de meus amigos e parceiros de consumo. Volta e meia, subo a lomba da Santos Ferreira para velar alguém que perdeu ou não teve tempo de acordar para uma vida espiritual e, assim, poder preencher o vazio que as drogas deixam na gente.
O último desses amigos que perdi, eu já estava com minha doença crônica estagnada (pois ela não tem cura), e ele foi buscar recuperação na mesma comunidade em que eu passei 10 meses. Chegou na Renascer e eu prontamente me propus a ajudá-lo. Não consegui, ele já estava em um estágio terminal de alcoolismo e havia desistido de lutar, saiu da Comunidade e só voltei a encontrá-lo em um caixão.
Esse é o efeito que as drogas e o álcool causam em um dependente, e sem ajuda o cara não tem coragem de lutar sozinho. Por experiência própria, eu sei que ainda vou computar muitas perdas pelo caminho de recuperação. O índice de pessoas que conseguem ficar em pé é de dois em cada 10, e isso se elas buscarem ajuda, quer seja de uma igreja, comunidades ou outra forma.
Existe saída, mas não é fácil, é preciso coragem para mudar os hábitos de uma vida sem rumo. É preciso novas atitudes, e corretas, para obter os resultados que podem levar a uma mudança de comportamento.
Amigos que encontramos
pelo caminho...
... tive um belo encontro na quarta de manhã com meu mentor profissional e grande amigo Antônio Canabarro Tróis Filho, o Tonito. Foi ele que me deu o primeiro emprego em Canoas, no jornal O Timoneiro, em 1978. Como incomodei o Tonito, fui seu empregado durante dez anos, e aprendi tudo que sei em jornal com ele. Para o Tonito eu tenho “trinta anos de praia”. Que nada, grande amigo, eu sou da sanga, e minha praia é um mundo de feliz recuperação e de gratidão pela vida ter me dado oportunidades de conhecer gente como você.
Adquiri a obra mais recente do Tonito, o livreto “Prosa Ligeira (quase verdade)”, e em sua dedicatória ele me escreveu: “Ao Marquinho, Lampião, que mantém acesa à fraternidade”.
Obrigado por tudo Tonito!
Coluna publicada no Jornal O Timoneiro
Canoas - RS
Cinco Marias
por Marco Leite
Finalmente consegui sentar para fazer a coluna para o Tribuna. Estou trabalhando sem parar desde domingo e hoje já é terça-feira, mas falo em trabalho dia e noite, com poucas horas de sono e falta de tempo até para as refeições. Fiz um boletim para os servidores públicos de minha cidade e estou produzindo um livro para um menino chamado Felipe, que tem dez anos, e vai lançá-lo na Feira do Livro de Canoas que será aberta no dia 20 de junho. O boletim eu diagramei e imprimi, entregando-o hoje. O livro está em produção e deve ficar pronto nos próximos dias.
Tenho trabalhado demais e poderia estar reclamando de tudo e de todos, das dificuldades, dos compromissos, das relações pessoais e de tantas outras coisas. Mas não vou fazer isso. Estou escrevendo para agradecer, primeiramente por estar vivo e com saúde para poder fazer tudo isso que citei acima. Agradecer pela convivência que tive com o Felipe e sua família hoje pela manhã, quando estive com eles produzindo umas fotos para o livro. Pude conversar com uma criança cheia de sonhos, a cada local da cidade que percorríamos para captar as imagens Felipe ía me contando um pouco de suas histórias, do colégio, onde jogava bola, do avô, da avó... Também contou as brincadeiras de crianças que ele faz. Fui pesquisando quais eram as suas preferidas e descobri que Felipe, talvez pelos ensinamentos dos pais, ainda preserva as velhas brincadeiras que fizeram parte também de minha infância aí em Uruguaiana.
Felipe joga bola no campinho do parque, coleciona figurinhas, joga bafo, bolita, sabe o que é pular uma sapata, entre outras tantas. Mas a grande maioria de suas brincadeiras são coisas modernas tipo jogar videogame, navegar na internet, uns bonecos estranhos (que ele diz que põem um em cada canto de uma mesa e o que derrubar o do outro fica com o boneco), não entendi nada do que ele me explicou, mas vou voltar a perguntar e aprender.
Depois dos lugares históricos da cidade fomos visitar o prefeito de Canoas, Jairo Jorge, e enquanto esperávamos para a audiência fiquei falando para o Felipe quais eram as minhas brincadeiras de criança em Uruguaiana. Falei das pescas, das pandorgas, das bolitas, de nadar no rio Uruguai, entre outras. Mas, uma em especial, chamou a atenção do Felipe, o jogo de Cinco Marias. Logo que ouviu, o guri se interessou e eu também, pois me senti jogando a pedrinha para cima e pegando primeiro uma por vez, depois duas, depois três, depois quatro e finalmente as cinco pedras, pronto passei de fase. Agora era atirar novamente as pedras e depois jogar novamente a pedra para cima e passa pela caverna feita com os dedos da outra mão. Ia contando a história do jogo para o Felipe e ele parecia que também estava jogando. Que papo maravilhoso!!!
Fiquei de produzir umas trouxinhas para o Felipe, é tipo um travesseirinho e cheio de arroz dentro, mas vou cobrar do guri ser o primeiro a jogar Cinco Marias com ele. Após fomos à audiência com o prefeito e o Felipe me deixou cheio de saudade dos tempos de guri de Urugauiana. Êta tempo bom, qualquer dia vou ai para nadar no Uruguai, dar uma pescada, e, se possível, tomar um banho de chuva. Se aparecer alguém para um desafio também posso jogar umas Cinco Marias.
Coluna publicada no Jornal Tribuna
Uruguaiana - RS
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